Como uma onda no mar!
Uma das maiores verdades que conheço a ouvi no rádio. Não me lembro quando, nem como, mas lá se vão mais de vinte anos desde que ouvi pela primeira vez, na voz do Lulu Santos, aquela que só mais tarde eu descobriria que seria uma das verdades que eu carregaria vida a fora: “ Nada do que foi será, de novo do jeito que já foi um dia”.
Aprendi depois que a canção é uma parceria do Lulu com o Nelson Mota, lançada em 1983, como parte da trilha sonora do Filme Garota Dourada. Descobri também que o Nelson se baseou num poema do Vinicius de Morais do qual até transcreveu o trecho: “ a vida vem em ondas como o mar”, outra verdade que a musica canta.
Mas hoje, eu dirigia pela cidade, nessas horas apressadas do dia, e por acaso, ou nem tão por acaso assim, essa música tocou no som do carro, a melodia leve, seguida pela voz inconfundível do Lulu, o primeiro verso me prendeu como se fosse a primeira vez que eu ouvia. Aquelas palavras ficaram martelando em minha cabeça, e enquanto esperava o sinal abrir eu me dei conta de que de fato, a musica tem muita razão, não! Nada volta mais a seu estado original, tudo muda e o que foi, o que fomos, nunca mais será o mesmo.
Não adianta, por exemplo, querer voltar à infância. Se por alguma razão fantástica nos fosse dada a oportunidade de voltarmos no tempo, a infância, aquela época da qual a maioria das pessoas lembra com nostalgia, não teria mais o mesmo encanto, porque tudo que foi belo, bom e gostoso, tudo ficou pra trás. Nós somos outros, já experimentamos o mundo, seus sabores e dissabores e perdemos o elo com quem fomos um dia. Nada faria sentido e talvez se tornasse até enfadonho, cansado, chato, porque o mundo não é mais um píncaro azulado e nós já experimentamos a dor e a delicia de sermos quem nos tornamos.
O mesmo vale para outras épocas. Quem de nós se ver ainda cometendo os mesmo erros de quando adolescente? Ou com a coragem e a ousadia que só aqueles tempos de descoberta nos impingiam? Poucos! Porque o tempo muda a gente e muda também o meio, as circunstâncias, o tempo leva tudo, embora traga outras coisas em seu lugar.
Aquele amor da adolescência, lembra ? Como era bonito e intenso, como parecia que a gente ia morrer de tanto gostar. Hoje a gente passa por ele na rua e no Maximo meneia a cabeça e pensa consigo: Deus! Eu era louco! E talvez fôssemos mesmo, o tempo leva e traz tudo, inclusive a cura para a loucura que faz a alegria de nossos dias memoráveis.
O fato é que a vida segue seu curso e não dá pra voltar atrás. Podemos repensar decisões, reavaliar situações, remendar o que estragou, mas acontece que nada a volta a ser como era antes, eis a grande tragédia da vida.
Há alguns anos eu li a biografia do Ex vice-presidente José Alencar, uma história muito boa, mas de tudo me chamou atenção uma frase que a personagem principal, o próprio José Alencar, fazia questão de citar: – “ Na vida o importante é poder voltar”. Concordo com ele que poder voltar é importante, mas sou obrigado a dizer que nunca se volta.
O filho que depois de deixar a casa paterna volta a ela, não volta o mesmo. Sente-se pássaro fora do ninho, desalojado porque ali já não é mais seu lugar, ele já não é o mesmo que partiu. O tempo e o
mundo lhe transformaram.
Os namorados que reatam o namoro depois de tê-lo interrompido por longo tempo. Como são lindos os recomeços! Mas nada será igual, haverá sempre um hiato de tempo, mesmo que seja uma presença muda, silenciosa, haverá sempre algo que um jamais saberá do outro: quem foram eles quando não estavam juntos. Voltamos outros, não adianta, sempre e sempre seremos outros porque ao menor sinal de partida o tempo corrói quem fomos.
A vida vem em ondas, já cantaram os poetas, esqueceram-se de dizer, que em cada onda que parte vai um pedaço da gente que não volta jamais. A vida é um ir e vir infinito, a gente, quem somos, só vai uma vez.