Textos

A gente colhe o que planta

Um dia, do nada, decidi ter um jardim. A despeito da falta de espaço, da falta de tempo e da pouca água, eu, teimoso que sou, decidi que queria cultivar minhas plantinhas.
Aproveitei uma reforma na calçada, mexi daqui e mexi acolá, achamos uma forma de construir um canteiro na frente da casa. Nada grandioso, mas que tivesse espaço suficiente pra comportar algumas mudas.
Não demorou e o canteiro estava pronto, até bem simpático por sinal. Demorou mesmo foi pra que eu achasse tempo pra semear minhas sementes, fazer as mudas, comprar adubo. O povo de casa já olhava com pena pro canteiro vazio, mais parecia um túmulo à espera de um morto qualquer.
Eis que em meados de janeiro serenou. Uma fagulha de esperança se acendeu em mim e em um desses meus arroubos, comprei uma porção de mudas de mini lacres. Eram mudinhas pequenas, mas verdíssimas. Plantei-as, juntamente com um mandacaru e uma palmeira mulambo.
Dia a dia, embora houvesse a correria de sempre, encontrava tempo para olhá-las ainda que de longe. Perguntar se haviam sido regadas. E elas lá, sobrevivendo.
Um dia, após um longo tempo sem me deter, eis que ao descer do carro percebo que de verde e viçoso mesmo, apenas o mandacaru. Todas as outras plantas, ali estavam murchas, capengas, até mortas.
Era um dia difícil e Pensei comigo, que se importa com plantas, tendo tanto o que fazer? Deixa pra lá, um dia planto alguma coisa.
Mas eu não conseguia esquecer, que meu jardim, não tinha flores. Era meu fracasso particular. Não me contentei. E aquilo ficou martelando em minha cabeça. Eis que na mesma semana vou passando na rua e vejo novas mudas, verdes, viçosas, lindas. Comprei-as. Levei-as pra casa e me pus a cuidar delas.
Conseguir adubo, coloquei eu mesmo no jardim, reguei e em alguns dias plantei, algumas mudas eu nem sabia o que era direito, mas eu queria um jardim.
Elas ficaram lá e eu secretamente morria de medo de vê-las secar. Toda tarde, ou tarde da noite quando chegava, lançava pelo menos um olhar. Vieram as chuvas de fevereiro, depois estiou em março, mas em abril mais e mais chuvas. Um dia decidi limpar o mato que já despontava em torno das mudas. Descobri os ossos do ofício de jardineiro: um sapo sem tamanho tinha escolhido o meu projeto de jardim para habitar. Corri légua, e quase não volto mais a mexer no jardim. Morro de medo de sapo!
Minha sorte foi Felipe, que, destemido, pegou o bendito com as próprias mãos( o que me deixou horrorizado) e o colocou pra morar num matinho perto de casa. Pouco adiantou, bastou chegar o dia seguinte e lá estava ele, de volta ao canteiro.
De tão pouco afeito que sou aos sapos, deixei de mão o jardim. Valderiza, minha vizinha, se compadeceu das pobres mudas e passou as aguar, pelo que sou imensamente grato.
Hoje cheguei mais cedo em casa, fato raro, que se justifica apenas pela dificuldade que encontrei de permanecer no trabalho, já que ninguém me queria por perto com minha conjuntivite, e mesmo de olhos inchados e vermelhos eu contemplei a cena do meu jardim florido.
Estavam lá as mini lacres com suas flores vermelhas vibrantes, algumas cassuarinas, um mandacaru, um Resendá branco florido….Estava bem bonito meu jardim. Pouco importa que seja apenas um canteiro com mudas, pouco importa que não haja espaço: eu tenho um jardim agora.

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